Por Clara Favilla
Todas nós somos Terezinha de Jesus, não é mesmo? Aquela que de uma queda foi ao chão. Acudiram-na três cavalheiros, todos três de chapéu na mão. O primeiro foi seu pai... Sim nosso primeiro amor, aquele que não tivemos opção a não ser a de dividi-lo com aquela mulher que habitava o castelo. A dona do castelo, a dona do nosso amor, a nossa mãe.
Nossos pais, como se barbeavam e a loção que usavam, como arrumavam as notas e os retratos na carteira, como lustravam os sapatos, a profissão que tinham, os livros que liam, as canções que cantavam, seus sucessos e fracassos... Nossos pais definem a escolha dos homens que amaremos pela nossa vida toda. Pelo avesso ou pelo direito, serão sempre nossas referências.
Eu amei e amo muito meu pai que já se foi há 18 anos, cedo demais. Assisto uma amiga querida a ensaiar a cerimônia de adeus para um pai bastante idoso e nem por isso o adeus será menos doloroso. Digo tudo isso porque recebi, para publicação neste blog, um poema escrito por um pai: Octacílio Lopes. O poema foi enviado pela filha Cris Lopes. Pai e filha jornalistas. O pai de Cris morreu aos 46 anos,em 1974. Estava doente, mas não se descartou erro médico.
Octacílio Lopes |
Eu já sabia que Octacílio Lopes faz parte da história do jornalismo brasileiro. Mas fui procurar mais informações no Google sobre ele. E está lá registrado que foi citado pelo jornalista e acadêmico Murilo Melo Filho,na saudação aos 60 anos de profissão de Villas-Bôas Corrêa, celebrados na sede da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), em dezembro de 2008:
- Amigos e colegas há 60 anos, somos nós dois os remanescentes dos anos dourados da política, um tempo em que se estabeleceu o modelo político forjado por grandes nomes como Heráclito Assis de Sales, Pompeu de Souza, Octacílio Lopes, Osvaldo Costa e outras dezenas de heróis do nosso jornalismo.
A pesquisa no Google também me faz encontrar a história 876 das 1950 do Folclore Político, contadas em livro por Sebastião Neri. Eis a história:
13/12/68
Jantar na casa do jornalista Carlos Castelo Branco , em Brasília. Oministro Gama e Silva,da Justiça, aparecena TV e lê o Ato Institucional Número 05 (É o fim do Estado de Direito). Castelo diz a Élvia, sua mulher: "Serei preso amanhã.Vou dormir. Daqui a pouco manda esse povo pra fora (...)
Ao amanhecer chegou a polícia. (...)
Castelo vai preso para o quatel da Polícia do Exército. O comandante Epitácio, que tinha sido Secretário de Segurança do Intervetor Meira Matos, em Goiás, recebe-o na porta: "A que devo a honra dessa visita?"
- Não vim visitar ninguém.
Minutos depois entra o jornalista Octacílio Lopes (o saudoso cara de Onça) e começa a matar os mosquitos do xadrez.
- Castelo será que eles deram esse golpe só por causa de nós dois?
Vai chegando mais gente (...). E dai a pouco protestando,esbravejando, arrastado o bravoSobral Pinto, então com 75 anos.
Bem, depois de tantas digressões vamos ao poema de Octacílio Lopes, enviado pela filha Cris Lopes, que continua declarando-lhe eterno amor e saudade
INTERVALO
De frente, a rua escura,
De frente, sempre na frente.
Em que pensa
(em que pode pensar?)
uma alma obscura
na rua escura?
Num pensamento cabem todos
os silêncios. Cruzam,
aflitamente enfeitiçadas,
todas as vozes. Mortas.
Todos os gestos. E a expressão
dos gestos sucumbida
em reminiscências. Vivas.
Lerda madorra de angústias,
Infinito gesto de descanso.
Presa à mente
repousa a sombra
das palavras.
Inaudível.
Das ausências que me habitam,
da palavra o uso não basta.
Clara, como lhe agradecer por tanta sensibilidade e beleza. Estou emocionada. Beijo grande e meu carinho.
ResponderExcluirClara, na emoção faltou o ponto de ?. Bjs de novo.
ResponderExcluirGente, que saudade do Octacilio e da Hilda. A impressão que tenho é que a Clara Favilla era amiga deles como eu.
ResponderExcluirCris, um grande beijo. Saudade é uma coisa viva dentro de nós.
Que lindo. Me lembrei do pai da Cris e da Vico.
ResponderExcluirParabéns pelo texto.
Ana.
É... as palavras não bastam para falar das ausências que nos habitam... Triste e belo...
ResponderExcluirA sensibilidade do texto Clara é emocionante. Não há como ficar indiferente a ele: emociona.Belissimo.
ResponderExcluirObrigada.
Nora
Das ausências que me habitam,
ResponderExcluirda palavra o uso não basta.
Por isso - aplausos!
Oi, Cristina,
ResponderExcluirQuando recebi sua mensagem com o poema Intervalo - enviado um dia desses - e soube sobre seu pai, passei a compreender algumas atitudes suas, bem como sua forma de pensar sobre vários assuntos. O relacionamento que mantemos é próximo no sentimento, mas sua história nunca me foi apresentada como está sendo agora, reforçada pela homenagem que acabei de ler no blog. Estou gostando de saber mais.
E que poema....li outra vez.
Parabéns à Clara Favilla.
Beijo grande,
Marina Mesquita
Bela homenagem da Clara à minha amiga Cris Lopes e ao seu pai. Belo poema do Octacilio! Imagino a emoção da Cristina... belo presente, Clara!
ResponderExcluirMárcia Brandão
Belíssimo texto e poema : )
ResponderExcluirPrimeiro parabéns à blogueira Carla Favilla que sempre escreve muito bem. Segundo, parabéns à Cris. Quem conheceu sua família também sente saudade. Seu pai era demais, tanto como jornalista político tanto como pessoa. Lembrei-me agora de outros amigos de 68.
ResponderExcluirOctacilio Lopes foi um vulto como jornalista e como amigo sempre solidário. Encarnava aquilo que o senso comum trata por "grande pessoa humana", o que rejeito por expressar algo sem sentido: pessoa humana?
ResponderExcluirNunca conversei com ele, mas conhecia bem o seu trabalho, sua solidariedade e o conceito de que o Cara de Onça dispunha - e ainda dispõe - entre colegas meus que estão pelo menos uma geração acima da minha.
Nunca conversamos, mas eu o via muito, o acompanhava a distância, sem ousar uma aproximação antes que outro colega nos fizesse as devidas apresentações pessoais. Aprendi na reportagem a me desinibir e tomar iniciativas de contatos. Mas fora do trabalho era diferente, a inibição me recomendava não perturbar Octacilio sem que entre nós houvesse uma pauta a determinar atitudes.
Agora, considero desnecessária menção ao Cara de Onça que, a título de apresentação, faça referência à amizade sólida que o ligava a colegas como Castello e Villas Boas.
Octacilio é um vulto autônomo. Digo isso porque sei de quem falo.
AC Scartezini
Agradeço muito o comentário do grande Scartezini. Valeu mesmo. Sei que você sabe de quem fala.
ResponderExcluirAbraços.
Aproveito, também, para agradecer a todos que aqui deixaram uma mensagem.
Amei, adorei!!! Viva o Octacilio Lopes de quem minha amiga herdou tantas coisas.
ResponderExcluirSó nos resta lembrar, Maninha, só lembrar...
ResponderExcluirClara, por causa da divulgação da amiga Cris, sempre leio seus posts. Hoje imagino que você deixou minha amiga e seus parentes emocionados. Achei tudo lindo. Não conheci pessoalmente o Octacílio, mas conheço a história. Sua morte foi muito comentada em Brasília. Lindo o poema dele, gostaria de ler outros.
ResponderExcluirSão estas histórias de vidas contadas pela Clara e retratadas em poesias elevadas como sabe ser Intervalo de Octacílio "Cara de Onça" Lopes, papai da nossa querida amiga Cris, que nos fazem recuperar a fé e o amor à terra em que nascemos!Grato, ABC fraterno (Abraço e Beijo do Cezimbra)
ResponderExcluirQue a Clara Favilla escreve bem nós sabemos, que a equipe do Café $ Veneno é feita de bons escritores, também sabemos. Faltava isso, a homenagem ao pai da Cris Lopes e o belo poema.
ResponderExcluirMíriam do TT
Muito bom poder ler e conhecer mais da história de alguém que lutou e participou da mudança do Brasil. Parabéns à escritora pelo texto expressivo e sensível e pela Cris por ser filha de alguém especial.
ResponderExcluirTão bom aprender um pouquinho sobre alguém que viveu a época do grande jornalismo.
ResponderExcluirÂngela Castro
Texto profundo e interessante, uma leitura que me agradou e enriqueceu
ResponderExcluirCris, deu uma saudade!!!!
ResponderExcluirAninha
Cris,
ResponderExcluirAcho que me emocionei. Meu pai foi meu grande herói também. Ensinou-me a desenhar e a ler. Lindo poema...
bjs
Telma
Cris, amei o poema do seu pai. Não sabia que ele era amante e escritor de poemas. Como jornalista, eu sei que ele foi , realmente, um grande marco na informação, talvez, por isso, tenha sido podado pelos ignorantes daquela época. È a vida.... Um abraço para vc. Myrtes
ResponderExcluirADOREI!!!! Muito gente esse seu pai e meu tio. Bjs
ResponderExcluirOi Cris, tudo isso é muito legal e emocionante. Nós tivemos o privilégio de sermos filhas destes homens maravilhosos e de termos vivido juntas nos anos 60 em Brasília, fazendo parte da primeira geração de adolescentes,frequentando os primeiros festivais, enfim uma época muito especial nas nossas vidas.
ResponderExcluirAdorei,
bjss
Luciana Castello Branco
Clara, parabéns pelo texto bem escrito e lindo. Cris, parabéns por ser filha de Octacilio e Hilda, não é pouco privilégio. Abraços em Vico e Simone.
ResponderExcluirLembra-se de mim, Cris? Fui seu colega no Tribunal.
Luiz Antônio
...dos gestos sucumbida
ResponderExcluirem reminiscências. Vivas.
Lerda madorra de angústias,
Infinito gesto de descanso.
Presa à mente
repousa a sombra
das palavras.
Inaudível.
Muito lindo!
Solange
Fatima Lopes
ResponderExcluirCris me fez lembrar da minha infancia.Da minha avó e tia Cleó arrumando as mangas rosa que ele tamto gostava.
Da ansiedade de todos pela visita de voces quando anunciada.
Tenho uma lembrança muito forte, dos poucos momentos vividos juntos,das coisas que MEU TIO OCTACILIO me ensinou.
Obrigada
FATIMA LOPES
Obrigada pelo texto lindo sobre meu avô.
ResponderExcluirMãe, só hoje puder ler mais um pouco sobre meu avô. Agradeço à Clara.
ResponderExcluirLindo, Cris.
ResponderExcluirO Octacilio era uma alma inspirada, além de inteligente, doce, vivaz, enfim, uma pessoa imperdível.
Sorte a minha que o conheci. Felicidade a sua, que, como filha, herdou muito dele.
Beijos.
Pris
Cris,
ResponderExcluirsaudade de você e dos tempos vividos.
Obrigada Clara, por escrever sobre o grande amigo de minha família.
Beijos,
Carmem Lúcia
Cris, só hoje vi. Que lindo o que sua amiga fez! Parabéns. Nós que conhecemos o Octacílio sabemos quem ele era e como vocês são parecidos.
ResponderExcluirLiliane
Clara Favilla, obrigada sobre o lindo artigo sobre meu amigo Octacilio. Cris, jamais esqueceremos o grande homem que foi seu pai.Amamos você.
ResponderExcluirElionor
"tem dia que a gente se sente, como quem partiu ou morreu..." foi assim que senti a saudade do meu amigo. Beijos Cris e Vico. Obrigada Clara.
ResponderExcluirFilhas do Octacilio, onde estão os outros poemas?
Maria H.A.
Ele foi grande numa epoca que exigia gente assim.
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