terça-feira, 13 de dezembro de 2011

La Peau Douce ... Nas asas da Panair

 por Clara Favilla

É início de tarde, terça-feira, 13 de dezembro. Míriam Leitão lembrou no twitter que há 43 anos, nesse mesmo dia, militares e ministros civis como Antonio Delfim Neto, assinaram o Ato Institucional número 05 (AI 5), declarando o fim do Estado de Direito no Brasil. Eu tinha 18 anos. Só dois anos depois eu estudaria na Universidade e Brasília 


Tenho muito o que fazer ultimamente e de dez coisas, acabo fazendo, por dia, duas de uma lista já em decomposição, Outras simplesmente vão acontecendo, aumentando a lista de pendências. Na lista de coisas chatas: contas a pagar, e-mails importantes não respondidos,  um trabalho de edição a finalizar e o pior: entrar no site da Receita e parcelar impostos em atraso. 

Também tem o trabalho de arrumação do escritório em andamento. Resolvi encaminhar para a reciclagem centenas de revistas que colecionei nos últimos anos. Ocuparam duas grandes caixas de papelão. Uma já foi despachada. Outra está no ponto de ser fechada. Todo trabalho pesado emocionalmente, e o de me organizar certamente é um deles, me (nos) deixa à beira de uma ataque de nervos. E foi assim que passei a manhã. Me livrando de parte do conteúdo das minhas estantes.


Cansada, resolvi dar uma parada depois do almoço.  Liguei a TV e um filme começava. Em preto e branco. Telecine Cult. E fui aos poucos reconhecendo aquela  história, que de início, me pareceu banal. A de um homem casado que numa viagem de trabalho se encanta por uma aeromoça. Prestava atenção com meus olhos de jornalistas e já fazendo reportagem. Começaria assim: É possível se reconhecer,  em filmes antigos, a Paris de hoje. Uma das  cenas se passa exatamente em determinado ângulo da Place de la Bastille. Depois aparece um aeroporto, o de Orly, o mais importante de Paris na época. O estacionamento em frente, está cheio de vagas. Impossível um filme atual em que o personagem chega e estaciona tranquilamente bem em frente à área de embarque. O avião é da Panair do Brasil.

Levei um susto imenso nas asas da Panair
Descobri que as coisas mudam 
e que tudo é pequeno nas asas da Panair
A primeira Coca- Cola foi me lembro bem agora
Nas asas da Panair
A maior das maravilhas foi voando sobre o mundo
nas asas da Panair


Logo em seguida, paro de fazer reportagem. Mergulho mais profundamente na sequência de imagens. Acontecem em um ritmo mais lento. Me parecem tão belas, tão íntimas, tão ternas que, de repente, eu estava de celular em punho fotografando a tela da TV. 

Qual o espanto?  É um filme de Truffaut (1964). Naquele ano, eu estava concluindo o Ensino Fundamental. Amaria Truffaut só anos mais tarde. E até hoje seus filmes me levam, invariavelmente, às lágrimas.  Chorei de soluçar, enquanto almoçava em um restaurante de Brasília, e uma amiga resolveu me contar a história de 'A mulher ao Lado', lançado em 1981. Já estávamos em 1984 e  eu não o havia assistido. A expressão "Nem juntos, nem separados", define o filme que acaba em tragédia.
 
Não vou escrever sobre o filme  de hoje, La Peau Douce.  Achei, via Google, o texto que vai abaixo no site http://cineweb.com.br . É de Neusa Barbosa. Tem muitas informações sobre o filme e sobre o processo criativo de Truffaut.

"Uma única cena define o espírito de Um Só Pecado: um homem casado, de meia-idade (Jean Desailly), tira as meias de sua jovem amante (Françoise Dorléac), acariciando suavemente sua pele doce, remetendo ao nome original francês (La Peau Douce). Esta seqüência, ao mesmo tempo de um erotismo e de uma delicadeza raras, revela melhor do que nenhuma outra a força do desejo que move a história.
François Truffaut, o diretor e roteirista, sabia bem do que estava falando. Afinal, este seu quinto filme era altamente autobiográfico, como praticamente todos os demais, aliás. Vivia uma crise em seu casamento, tinha tido um caso com uma aeromoça e, como o protagonista, saíra para comprar meias de seda para a amante. Cenas da vida do casal em crise foram filmadas no próprio apartamento em que Truffaut morava com a mulher, Madeleine, e suas duas filhas, em Paris.

Um Só Pecado é a autópsia do casal, um filme incrivelmente deprimente, sem saída, sem solução", definiu ele numa citação de sua esplêndida biografia, François Truffaut, escrita por Antoine de Baecque e Serge Toubiana. Nada mais exato do que essa descrição: pouco depois da estréia do filme, que concorreu no Festival de Cannes em 64 e foi mal recebido pela crítica francesa, ele e a mulher divorciaram-se. Um Só Pecado é, portanto, retrato de uma intimidade que Truffaut não hesitou em dividir com o público, da mesma forma que expôs os traumas de sua adolescência complicada na série de filmes com o personagem Antoine Doinel (Jean-Pierre Léaud, que aqui funciona como seu assistente de direção).

Visto apressadamente, o filme pode parecer um retrato banal da crise de um casamento. A primeira armadilha, no caso, é deixar-se enganar por essa aparente simplicidade. O diretor fez aqui o que sabia melhor - traçou um painel intenso dos sentimentos humanos, com uma impecável economia de imagens e palavras. Nada sobra, nada falta nas obras desse cineasta, um esteta que dominava o segredo de não enfadar o público nunca estendendo-se além da medida.

O marido da história é Pierre Lachenay (o ator de teatro Jean Desailly), diretor de uma pequena mas prestigiada revista literária. Casado com Franca (Nelly Benedetti), tem uma filha pequena, Sabine (Sabine Haudepin, vista em outro filme do diretor, Jules e Jim). Com uma vida tranqüila, acomodada, Lachenay viaja bastante, realizando conferências. Numa delas, conhece uma jovem aeromoça, Nicole (Françoise Dorléac, bela e talentosa irmã mais velha de Catherine Deneuve, que morreu num acidente em 1967, aos 25 anos).

A partir desse encontro, tudo na vida do jornalista é turbilhão. Lachenay vive afobado, correndo, mentindo para encontrar a jovem, que também leva uma vida itinerante. As diferenças entre os dois serão expostas numa viagem a Reims, onde ele deve fazer uma conferência, e ela o acompanha. Os planos dele, de desembaraçar-se rapidamente do compromisso profissional para ficar com a moça, são desafiados por uma extensa agenda social, armada por um colega de juventude (Daniel Ceccaldi), disposto a impressionar a sonolenta sociedade provinciana às custas do visitante. Colocada na posição clandestina de amante que deve esconder-se, a moça ameaça ir embora.

Outro segredo de Truffaut ao contar esse tipo de história é jamais resvalar para qualquer sinal de vulgaridade, nunca aumentando a temperatura das emoções mais do que precisa para descrever uma situação. Assim, mesmo uma personagem exacerbada como a mulher traída nunca perde a estatura humana, por mais radical que seja a solução que ela encontra para seu próprio drama.


Além de sua própria biografia, Truffaut também gostava de colecionar recortes de jornal, impregnando ainda mais de realidade os seus roteiros. Aqui, recheou a história com detalhes tirados de dois famosos crimes pós-adultério, o caso Jaccoud, ocorrido em Genebra nos anos 50, e o caso de Nicole Gérard, na França, em 63 - de onde ele tirou a situação no restaurante com o fuzil de caça.

Outra curiosidade está no próprio nome do protagonista, Lachenay, que era o sobrenome do melhor amigo do diretor na vida real, Robert Lachenay, que apresentou Truffaut à obra de Balzac, objeto da primeira conferência do personagem no filme.

Dizer que já não se fazem mais cineastas como François Truffaut pode parecer saudosismo, mas é a mais pura verdade. E, como a maioria de seus filmes sequer existe em vídeo, muitos fãs mais jovens de cinema nem mesmo têm a oportunidade de conhecê-lo, fora das mostras e relançamentos especiais, como é o caso deste, e que deve ser ainda mais comemorado por ser em cópia nova.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Guerras Desconhecidas do Brasil (Estadão) ganha Prêmio Direitos Humanos de Jornalismo

 Por Leonêncio Nossa 

O caderno especial “Guerras Desconhecidas do Brasil”, do Estadão, venceu o Prêmio Direitos Humanos de Jornalismo (Categoria Especial - resgate Histórico), que vem sendo concedido desde 1984 pelo Movimento de Justiça e Direitos Humanos, Associação dos Repórteres Fotográficos e Cinematográficos do Rio Grande do Sul e Ordem dos Advogados do Brasil.


A reportagem recebeu o “Prêmio Especial” do júri, pelo “resgate histórico” de 32 conflitos populares ao longo do século 20. Os jurados consideraram que o caderno foi um dos “melhores trabalhos apresentados nos 28 anos do prêmio”.

Um parentese, por gentileza: Eu sei que a questão dos direitos humanos perdeu espaço para outros temas até mesmo na rede de organizações sociais... eu sei que a "moda" é discutir "mídia"... eu sei que as universidades guardaram suas bandeiras históricas... eu sei que os governistas de ontem e os de hoje acham que o Brasil deve ir "para frente" a qualquer custo, sem garantir a integridade de comunidades tradicionais, os direitos dos peões e o respeito aos excluídos de sempre... eu sei que questionar - só questionar - um projeto de infraestrutura dos tempos sombrios de Geisel pode, agora, render rótulos estranhos... eu sei que o amigo da esquina pode zombar de uma demonstração de espanto diante do tratamento de presos nas delegacias, do fuzilamento de civis pelas polícias do Rio de Janeiro, de São Paulo e do Recife...

Enfim... paciência... o que a gente curte mesmo é falar dos brasileiros simples... é ironizar militantes e suas causas "grandiosas"... é publicar uma reportagem clássica.

NR . O Caderno Especial do Estadão com a reportagem vencedora foi assinado por LEONENCIO NOSSA e CELSO SARMENTO